More
    InícioArtigosSelic alta é desafio e oportunidade para o varejo inovar no crédito

    Selic alta é desafio e oportunidade para o varejo inovar no crédito

    A alta consecutiva da taxa Selic, que agora está em 13,25% ao ano – com projeção de atingir 15% de acordo com o Relatório Focus do Banco Central – revela um fenômeno curioso: ela representa um desafio e também uma oportunidade para o varejo. Isso porque, com o aumento da taxa básica de juros, é natural que o crédito fique mais caro e, por isso, mais restrito a apenas uma parte da população; em simultâneo, essa situação dá ao varejo a oportunidade de sair na frente ao ser ele a oferecer boas opções de limite de crédito àqueles não contemplados pelas linhas tradicionais. Afinal, independentemente do valor das taxas de juros, da inflação ou da alta do dólar, as pessoas continuarão precisando ter necessidades atendidas, sejam elas as mais básicas ou não.

    Alguns fatores corroboram para este protagonismo do varejo: de acordo com a Febraban, a estimativa de crescimento no estoque de crédito para este ano deverá ser menor do que em 2024, ficando em torno de 9%. Além disso, o Índice de Confiança do Consumidor chegou ao menor número desde fevereiro de 2023, alcançando 86,2 pontos, de acordo com o FGV IBRE. E, em um cenário econômico como o que estamos vivendo agora, que exemplifiquei acima, é comum que itens que não sejam de primeira necessidade, como roupas e calçados, fiquem em segundo plano e a prioridade dos gastos seja com alimentação, medicamentos e combustível, por exemplo.

    Então, se o consumidor vai até uma loja de roupas, ele poderá precisar de uma linha de crédito que não comprometa o limite do cartão bandeirado que ele tem com o banco para comprar uma peça, pois essa quantia do limite está reservada para as compras de itens essenciais, como os citados anteriormente. Neste cenário, cria-se a necessidade de fornecimento de um crédito novo, seja para o cliente comprar itens de vestuário ou até mesmo uma TV ou geladeira, que também são necessários de acordo com cada contexto.

    Naturalmente, esse cliente vai usar a linha de crédito ofertada por varejistas que dispõem desse recurso. Desta forma, cria-se um elo muito importante de relação de confiança entre o consumidor e o varejo, fortalecido por um relacionamento elaborado anteriormente por meio do oferecimento de outros serviços de varejo, como os cartões Private Label e o CDC. Neste contexto, a janela de oportunidades é bem grande, porque o varejo passa a ser um dos principais canais de concessão de crédito para o consumidor final, visto que as instituições financeiras não têm bens de consumo para venda ou um balcão para relacionamento, característicos do varejo.

    O varejo pode até ter o desafio de lidar com a inadimplência dos consumidores, mas ainda assim ele precisa manter suas vendas em crescimento. Então, ele prefere correr esse risco e fazer a venda para o cliente, aumentando o ticket de compra, do que perder a oportunidade. Ao mesmo tempo, o varejista sabe que não deve cometer erros ao selecionar os clientes aptos a terem uma linha de crédito ou não, por isso deve contar com boas ferramentas de CRM, de gestão do crédito e de cobrança para cuidar de todo o ciclo de vida do cliente, avaliando qual é o tipo de consumo ele faz; qual valor, em média, ele costuma gastar; qual é o perfil daquele consumidor etc – essas informações ajudarão o varejista tanto na aprovação quanto no aumento de limite para que esses clientes possam fazer compras em suas lojas. E essa é uma das grandes oportunidades ante o desafio que o setor terá em 2025.

    Além disso, o varejo tem um diferencial muito importante quando comparado às instituições financeiras: em situações de inadimplência, as políticas de acordo são muito mais amigáveis, já que o setor se preocupa em encantar o cliente e em trazê-lo de volta à loja para que ele compre mais, porque não quer perdê-lo. Já a relação do consumidor com os bancos, muitas vezes, é apenas econômica. Essa troca faz parte do DNA do varejo, pois mesmo em situações adversas, a fidelização do cliente é necessária. Em meio a essa oportunidade, o varejo precisa ser muito eficaz, rápido, inteligente e cauteloso.

    Um modelo de pagamento bastante eficiente que o varejista pode oferecer como alternativa ao cartão de crédito é o CDC Digital/BNPL (Buy Now, Pay Later), que pode ser muito bem utilizado para a aquisição de bens duráveis, pois funciona como o antigo carnê. Existe um limite em que o cliente pode comprar de maneira recorrente quantas vezes quiser, mas ao mesmo tempo ele dá a possibilidade de aprovação de um limite de crédito por compra, de forma específica.

    Hoje, como as formas de pagamento estão simplificadas, este é um produto que vem a calhar, já que passou por uma transformação digital: as transações são tokenizadas e por biometria facial, sendo possível pagar as parcelas com boleto online dentro do aplicativo ou Pix etc. Estas modalidades de crédito, que citei anteriormente, mais do que ferramentas de acesso ao crédito, funcionam como importantes produtos capazes de promover campanhas assertivas e garantir a oferta de produtos direcionados especialmente para o perfil de cada cliente.

    Além disso, são instrumentos bastante estratégicos para ativar clientes que já estão na base do varejista, mas não têm realizado compras, ou seja, estão inativos. Então, é preciso que haja uma reativação da base de usuários e de consumidores antigos com ofertas direcionadas, baseadas em experiências novas e numa jornada sem atrito para o cliente em todas as etapas, desde a ativação dele até o pagamento das faturas.

    Outra tendência que, com base na minha expertise, vai se destacar este ano é a tokenização, inclusive o pagamento por token offline, fora do ambiente logado do aplicativo. Com as devidas autenticações de segurança, percebo que esse tipo de transação também será responsável por diminuir o atrito na hora da compra no varejo. Destaco ainda a consolidação do Pix, que alcançou 63,51 bilhões de transações em 2024, segundo o BACEN, mas que é uma agenda de pagamento importante para o varejista e o cliente final, porque traz vantagens para ambos os lados.

    Para o varejo, o dinheiro entra na conta imediatamente e não fica preso nas instituições financeiras ou nas intermediadoras de crédito. Para o cliente final, que precisa do crédito para comprar novamente, é possível ter os benefícios do cartão da loja, do desconto em produtos, mas fazer o pagamento da fatura por Pix, seja no aplicativo ou no totem do estabelecimento, e assim ter o limite restabelecido em uma fração de segundos. Para os dois lados, a jornada é facilitada. Dessa forma, percebo que o varejo toma a frente no cenário da concessão de crédito e no relacionamento com o cliente. Assim, ele fica responsável inclusive por protagonizar as transformações digitais que ocorrem no setor de meios de pagamento, jornada de compra e experiência do cliente.

    Glauco Soares Filho
    Glauco Soares Filho
    Glauco Soares Filho é co-fundador da RPE - Retail Payment Ecosystem. Tem 20 anos de experiência na indústria de meios de pagamento e está atento às diversas transformações do setor.
    MATÉRIAS RELACIONADAS

    RECENTES

    MAIS POPULARES

    [elfsight_cookie_consent id="1"]